sábado, 31 de janeiro de 2015

Soneto Inglês, nº 86(Sobre Arunquê des-Brasil. Pro Augusto Guimaraens Cavalcanti)


Na Cramulêra que as cidades Viraram
passam mugentes boiadas
bafando enxofre pelas ventas de aço.
Abismos que não devolvem

Os aimorés guajajaras plantados no Beleléu
desque uns pirongo enorme
chegaram trazendo uns branco de saia:
e já chegaro masgaiando Tudo.

Dispois foi Coisa(inté hoje) esse jambú dos infernos
mandando pra Zé Caronte os cabró preto
que apesar das chibatas inda fizero
isso Daqui que a gente chama de Pátria____

Onde Amarildos inda se fodem às pencas,
fadados a não parar de morrer.
(Imagem: Cenas Brasileiras, de Portinari)

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

No Bosque Antigo(Para Heyk Pimenta e Carolina Turboli)

"Os sonhos que rabiscam velhos mares não são mais daquela finitude antiga;
e ser, nesta meia-hora, é descascar sem muita pressa, é interpretar nuances de magia"
                                                                           (Ana Cristina Cesar)

No bosque antigo o mês setembro
por Tudo. Noite alta já.
Três mulheres de pedra
vigiam-lhe os passos
desque de Emaús chegaram novas do Hóspede.

O ar como que enchido
em grandes poços cabindas,
no céu por sobre a planície
ela Senhora, a lua negra.

As três mulheres de pedra dançam a Roda,
gargalham em seis idiomas
grandes árias do Êxtase.

No bosque antigo a primavera Chega
montada em coches de bronze
sobre a largura da Terra, os mapas todos
nos vagalhões da Memória:
homens caem do tempo.
(Imagens: Três mulheres nuas, de Ismael Nery. E pintura de floresta à noite)

Cântico de Antares(Pro Augusto Guimaraens Cavalcanti)

Então que ainda me Existo
sob essências de  Pedra. Aquela nuvem distante,
os corvos em Tel-Amarna,
trigo nos estômagos do  homem.

Cinquenta e seis dias  fui  balaão no deserto,
eram  de areia as  palavras.
Primeiros deuses foram  estátuas de sal
sob crepúsculos ainda jovens
do  grande  Eufrates. Houve tardes,
manhãs.

Inda me  Existo
defronte aos  grandes Áquilas  de  ferro,
areias presas em relógios
me lembram  pássaros-Bronze________

Devo  Existir  até que sopro dos Três
complete  o   Livro  dos Dias.
(Imagem: Eco Morfológico, de Salvador Dalí)

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Arpoador, à noite

Esta  noite  te  Encontro
junto às areias, num  dia
em que libriões  pneumáticos
andaram  sob  um céu de bronze
com girassóis e urubus, passando  a tarde
entre a cabeça  e os  braços  da Estátua,
após subirem nus  o corcovado.

Desfolho dálias  gigantes
sobre  teu  corpo, junto  às  areias
dum  solitário  mar de coral,
enquanto  assamos  os peixes
e  os  cinco  pães, à  espera  do  Hóspede.

Vemos  poemas nadando ao longe
e  tu  me  lembras   dos  nossos
andando  sobre  pianos,
quando  as nuvens  nos  serviam  de alimento.

Hoje  esperamos  a  Virgem
trazer  nas asas  o  fim  do  mundo
e enquanto  isso
andamos  na  máquina  do sonho
sobre  tapetes  submarinos.
(Imagem: sem título, de Salvador Dalí)

Quadro (Pra minha irmã Débora Nascimento)

Oswaldo  Cruz  coroaço
um dia  em frente  dum pintor:

O tom grisalho  do cabelo,
o bigode negro______
os  mesmos  das futuras   cartilhas.

Linho  branco  de  impecável  terno,
um bolso  esconde  da vista
a  mão direita, enquanto a outra  -  Lassa, 
junto do panamá

O  olhar  se estende  pra  bem  longe_____
 flerte
à  eternidade   ali   Rente.

(Sobre  quadro  de  J. Batista, numa reprodução
vista  por mim no Lapa Café, av. Gomes Freire ao
lado  do  TRT, centro  do Rio.)

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Prece dele São Mármaro(Oração proferida em 1940 em frente à Igreja Matriz de São João Marcos-RJ, quando Getúlio Vargas decretou a demolição da cidade, que seria inundada por causa do aumento da represa de Ribeirão das Lages, por ordens da Light. Para Fernando Portugal, e à memória de seu avô, que era médico em São João Marcos e lutou FISICAMENTE com as forças policiais pra que a cidade, patrimônio histórico NACIONAL, não fosse destruída. A história PROVOU que tal decreto presidencial foi INSENSATO. Também à memória de minha mãe, em seu aniversário de falecimento. Requiem aeternam dona eis, Domine, et lux perpetua luceat eis.)

Senhor do mundo, vós Três
me conheceis a caveira: este androloso navio,
embora dele Indigno eu seja,
como de resto imereço o Sopro mágico
que ora me aparta dos nove braços
da Terra, igual Manhã de nós todos  -
latinos gregos hebraicos

vós Três sabeis, meu Deus!
Que essa caveira montou pernas e braços
nas caravanas que subiram o Eufrates,
onde em bazares, e mafuás, jorravam séculos
de cima dos elefantes  -
há muito as amas de leite
dos nhonhôs Ofídicos,  -
e entre estes braços me envergonho, Incluso.

A própria terra inda não se enxugara
das águas de vossa Ira, e já meus olhos eram Semente
na voz do antigo Dragão.

Sou hoje a idade do bronze
multiplicada em Frestões
de novecentas manhattans,
subi os galhos do menezes côrtes
como também o fizeram
meus pais e avós em Babel, antes das guerras
descambonarem cogumelos gigantes sobre a cidade de São João Marcos,
como hoje se Vê.

E foram tantos sinais
de vosso abraço que não Vicejamos,
nem mesmo enxergamos o sol
nos girassóis de Van Gogh , Erê ele mesmo, um dos maiores
da sacra Ordem de Viramundo

hoje em riba e por Tudo
noite se espreguiça elástica
na mambucaba das Horas, as lampadosas do Encanto
não vigem nos terraços do mundo mais nada
além de espinhões gafanhotos rançosos todos
de Abismo, ninguém não vendo_____

que Amigo ainda ressuscitas toda manhã
nos ombros de cada homem
ainda pleno de Infâncias.
Miserere nobis, Domine. 
 (Restos da antiga Igreja Matriz, construída em 1796 e que um dia reuniu preces e casórios na cidade de São João Marcos, localizada na região do Vale do Paraíba, no interior do Rio de Janeiro. Foto: Sofia Moutinho)

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Sermão da Sexagésima(Pregado por São Mármaro a uma platéia de peixes-boi no igarapé nº 612 do rio Amazonas. Pra Augusto Guimaraens Cavalcanti. À memória de Ismael Nery)

Nos túmbaros des-Zabelês
que são toda mortícia Canalha a fulustrar
lá desde o senadão Roncôlho,
Brasília mais nas carrancas
caga redondo uns Furuncos____
país que a gente mais Desconhece.

E nossos índios Desvivem
descatembrados de seus quatis e maracas,
almas sendo Vendidas
nos furdunçós da bovespa como ele Renato
antecipara em fagulheiras do Aborto____

e desde sempre quantos leiteiros Matados,*
quantos josés indo pros Quintos
ver Amarildos(nunca manguantes
daquele sono em gaveta do são-jão-batista)

pra não falar nos erês
lá de Quintino e Mesquita
e Corte Oito e Pavuna
e Curicica e Gramacho
e Taquaral, Mato Alto,
sempre entupindo a barca dele Caronte____

são túmbaros des-Zabelês mais rinchavelhos de Assombro,
vindos de lá do planalto num cagalhão Ressumbrário
de ter ajêito
mais nunca de Núncaras.
(Imagens: Cabeça de Cristo, de Ismael Nery, e Enterro, de Portinari)
*Ver poema "Morte do Leiteiro", de Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Poemino(Aos amigos/irmãos Fernando Portugal e Allan Souza)

Esta roseira, em Pé
como um vigia entre as colunas da Noite
manduca* de não sei Onde
odores mágicos:
Esperanças brincam de roda
como se nunca houvessem morrido
dentro dos homens, e tudo Fosse,
de novo o chão
por onde os pássaros  voam

Fosse o leiteiro, assassinado Nunca,*
e Juscelino e Tancredo em nossas retinas
sem Borras de tragédia e lágrima,
fossem os  índios  no Maracanã
de cara  Odara e libertos
dos mutuíns do capeta e 
da  politicagem, se isso a roseira  me desse
eu pediria, Refestança no rosto,
tez-Infância no peito.... mas fica
a dança que É, toré de seiva
iluminada pra calar meu pranto:

esta roseira em Pé
sacode pra longe ogros e demais sustos
dos braços da noite, a paz mais solta,
odorante, entrando firme, Posseira
nas Cinco Salas da gente.

                                 *(Ver poema "Morte do leiteiro", de Carlos Drummond de Andrade)
                                 *Manducar = Trazer(Dicionário Adirônico)









sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Anamorfose(Pra minha irmã Laura Pires. E pra Fatine Oliveira)

                                       "____Debruçado à varanda/que enxergas no horizonte?                                                                              

                                       ____Órfãos, loucos, aleijados/em carros tintos de sangue,                                                                          cegos guiados por cegos.

                                       ____Que enxergas mais no horizonte?

                                       ____Vejo a morte graciosa."(Murilo Mendes)

                                       "Eu preciso destas palavras. Escrita."(Arthur Bispo do Rosário)

                                                                                                                                                                    

 Os hômi Môrto  -  descôche, puto, cambóta  -
nóis Semo. Jacinto
em fuso de Tudo: maravalha e morte,
entrós os Côbros
dos esperantos mais  Sepultura.

Nós somos  o reverbério
de  erês-Infância defuntos,
roncós de trevas
a retinir desde o assassínio  do Alferes:

Eli Eli
sabactâni lemá!! Fulgência  em Nada a  Mara  cor
descalça  há tanto  dos verbos que  no Princípio
andaram léguas  no rosto dos primeiros  Três...

e novamente  a Terra  se encheu  de violência
e num contínuo é mau todo o desejo humano___
à Véra  o rapaz morto  em cós-Dilúvio na sala*
(carpideiras junto de Antélia, mulher de Ló):

nóis semo  os Môrto já falava seu Ínston*
no reverbério  
lá n'Oceânia daqui  di-Mêrmo,
onde nas portas janelas salas pernabandeiras
e lá no Dentros dos hômi
riba e leira: mil novecentos e oitenta e quatro
des-quizombando por Tudo_____


Dies irae, dies illa,
solvet saeclum in favilla.

                                   *(Ver poema "Improviso do rapaz morto", de Mário de Andrade)
                                   *(Ver "1984", de George Orwell)
                                   *Salvador Dalí - Metamorphosis of Narcissus (1937)

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Maxixe de Torna-Bonde(Para a amiga Danielle Ronald de Carvalho)

Quando de-Novo os bondes
subirem os ombros de Santa Teresa
pelos braços do Curvelo antigo
já não haverão maçãs envenenadas,
e os pássaros sorrirão tecendo cantigas
nas linhas suplementares da pauta.

Então os arcos da Lapa já não serão
aquele elefante de muitas pernas seguinte em rumo
Nenhum,  e a prefeitura abrirá concurso
pra  nova leva de pingentes. 

Ali pela cacunda da joaquim silva
fuzarca-ebó Garantida: punks e putas,
sambistas, os ambulantes,
e toda a trupe de pelintras de carteirinha
entoarão kyries e vassuncristos,  pontos de macumba
e letras de capoeira, numa senhora Quizomba
ver maxixe de Torna-Bonde_____


já não haverão maçãs envenenadas
e os pássaros sorrirão tecendo cantigas
nas linhas suplementares da pauta quando,
pelos braços do Curvelo antigo os bondes subirem,
de-Novo, os ombros de Santa Teresa.

P.S.
que não se deixe, porém, que os mortos no grave acidente
de agosto de 2011 MORRAM OUTRA VEZ,
trancados em estátuas de pedra
(me tranquiliza saber   -  por boca de Geraldão Viramundo
e Arthur Bispo do Rosário que os políticos responsáveis
pela tragédia têm lugar especial reservado no inferno).













sábado, 3 de janeiro de 2015

Visões de São Mármaro, nº 11(Pra querida amiga Lucinha, no seu aniversário)

Há tempos a flor do Carlos  -  a que brotou no asfalto
da(então)capital do país às cinco horas da tarde  -
parece ter  implodido, junto dos homens
Mortos em seus ternos de aço. Há tempos um céu de bronze
parece ter espantado os verdadeiros pássaros. Os avejões do Estinfálio
parecem donos do espaço, bravateando arrotos de petróleo.

Já quase não há quem saiba
do paradeiro do Hóspede, há muito órfão das casas,
mais órfão dos Corações. Caronte já quase doido
não sabe mais onde arranje lugar na barca dos mortos
pra tanto erê dos subúrbios, pasto de um mundo Corno
que não tem fome nem sede de Justiça. Os olhos do capital
são sete cabeças dez chifres
e mais os gafanhotos do grande Abismo, zambaluês morticentes
que se esparramam dentro dos homens, que já vão Mortos
desde antes da fundação do Mundo.

Vi grandes anjos
montando águias no céu, junto de fagotes alados
e pianos num corcoveio por Tudo____

mostrando pra toda a carne
seus dedos médios Gigantes. 
(Pintura de Portinari)